Reconhecimento cultural, luta por valorização e a importância das parteiras em diversas regiões do paÃs
Entre 2008 e 2011, o Instituto Nômades fez um levantamento dos conhecimentos e práticas das parteiras tradicionais e indÃgenas de Pernambuco, ouvindo mais de 200 parteiras. Esse trabalho ajudou no pedido de reconhecimento do OfÃcio de Parteira Tradicional do Brasil como Patrimônio Cultural em 2011. Apesar do valor cultural reconhecido, a Câmara Técnica inicialmente se opôs devido à ligação entre a prática cultural e a saúde pública. Em 2016, uma nova avaliação foi favorável, reabrindo o processo.
Em 2018, um acordo entre o Iphan e a Universidade Federal de Pernambuco iniciou uma pesquisa nacional para documentar as práticas das parteiras tradicionais. Essa pesquisa tinha como objetivo ampliar a valorização e o reconhecimento dessas práticas como patrimônio cultural, abordando também a relação das parteiras com as polÃticas de saúde e a falta de um cadastro nacional atualizado.
No inÃcio de maio de 2024, na sua 104ª Reunião, o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, ligado ao Iphan, reconheceu o trabalho, os conhecimentos e as práticas das parteiras tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural nacional, registrando-os no Livro dos Saberes. Esse registro visa reconhecer, promover, valorizar e proteger os bens imateriais que fazem parte da diversidade da sociedade brasileira.
O reconhecimento das parteiras tradicionais como patrimônio cultural representa uma mudança importante, pois permite novas narrativas sobre seu papel social e cultural. Esse reconhecimento não é uma nostalgia do passado, mas uma valorização das parteiras como figuras atuais com conhecimentos diversos. A abordagem patrimonial também considera a saúde, propondo uma reflexão sobre o patrimônio imaterial relacionado ao cuidado e ao bem-estar, fundamentais para a vida humana. As parteiras, com seu conhecimento especial, voltam a ser valorizadas, contribuindo para uma reparação histórica e o fortalecimento das identidades culturais.
O que é ser parteira tradicional?
Ser uma parteira tradicional significa muito mais do que apenas auxiliar no nascimento de bebês. As parteiras tradicionais são mulheres que detêm um profundo conhecimento ancestral sobre o processo de gestação, parto e cuidados pós-parto, transmitido de geração em geração, muitas vezes de maneira oral e prática. Elas atuam de forma comunitária e humanizada, oferecendo suporte fÃsico, emocional e espiritual à s gestantes e suas famÃlias.
As parteiras combinam um dom divino com aprendizado empÃrico, onde o dom está ligado à missão de ajudar outras mulheres. Elas compartilham um universo simbólico com suas clientes, baseado na experiência comum do parto. Para as parteiras, o parto é visto como um evento de vida e morte, com a missão de salvar mãe e bebê. A relação entre parteiras e gestantes é baseada em confiança e afeto, semelhante a laços familiares.
As parteiras tradicionais não se limitam a partos domiciliares, pelo contrário, elas são cuidadoras em suas comunidades. Além de assistência à gestante e à criança, do pré-natal ao pós-parto, mobilizam cuidados de saúde de forma holÃstica e coletiva. Elas promovem uma visão integral de saúde, conectando bem-estar familiar e qualidade de vida social.
Em muitas regiões remotas e comunidades tradicionais, onde o acesso aos serviços de saúde é limitado, as parteiras são a principal ou única opção para as gestantes, portanto, desempenham um papel fundamental na garantia de que todas as mulheres tenham acesso a um parto seguro e digno. Assim, elas desempenham um papel essencial na saúde pública, ajudando a reduzir a mortalidade materna e infantil e promovendo a saúde reprodutiva.
Apesar de sua importância, as parteiras tradicionais enfrentam desafios como a falta de reconhecimento formal, dificuldades de acesso a recursos e formação, além de perseguição de práticas médicas convencionais. No entanto, o reconhecimento de seu ofÃcio como patrimônio cultural imaterial pelo Instituto do Patrimônio Histórico e ArtÃstico Nacional (Iphan) é um passo significativo para valorizar e apoiar seu trabalho.
Ser uma parteira tradicional é, portanto, um ofÃcio que integra ciência, arte, cultura e espiritualidade, e desempenha um papel vital na saúde e no bem-estar das mulheres e das comunidades.
Para saber mais – e se emocionar
O filme Nossas Mãos são Sagradas é uma realização do Museu da Parteira e da Bebinho Salgado 45. Realizado parcialmente com recursos do 3° Prêmio Ayrton de Almeida Carvalho de Preservação do Patrimônio Cultural de Pernambuco, o mini documentário acompanha um encontro entre parteiras e aprendizes, no qual os sentidos, os significados, as relações estabelecidas e os elementos que constituem esse ofÃcio são revelados.
Assista aqui: https://youtu.be/XN-Vk4lkHF4?si=btA3M9nidCp6cHmm